quarta-feira, 27 de maio de 2015
CRIANÇA A(R)MADA
Braço de criança
não é para segurar a morte.
Mão de criança
não é para apertar gatilhos.
A emoção que aciona
o coração da criança
tem que ser somente
a do amor
ou da ternura.
Não pode ser a do ódio
dos que inventam a guerra.
Elas não podem
ser testemunhas
do terror que os adultos
disseminam em campos de morte.
Essas guerras não são delas.
Elas não têm conta bancária.
Não têm ações em bolsa.
Não se reúnem em Davos,
nem possuem telefones vermelhos.
Elas não têm controle acionário
de fábricas de armas.
Não assinam falsos tratados
garantidos por poços de petróleo
e nem sabem apertar botões
que podem destruir seis mundos.
Elas ainda não aprenderam a odiar.
(Wenceslau Gonçalves, maio/2015)
terça-feira, 5 de maio de 2015
"MAIORIDADE MENTAL'
O tema é recorrente. O
próprio fato de que o projeto que trata da mudança da maioridade penal (para 16
anos, neste caso), recentemente aprovado na Câmara Federal, teve sua origem há
alguns anos. O que, ao retornar à Pauta agora, demonstra que houve, também, intencionalidade
em aproveitar um momento de confusão no País para decidir sobre um tema de tal
importância dada suas implicações legais e, sobretudo, sociais. O projeto
“repousava placidamente” há mais de dez anos nas gavetas indecifráveis de nossa
principal Casa Legislativa. De repente, sem mais aquela, Suas Excelências
decidem que é a hora de aprovar a matéria. Reúnem-se as “Bancadas BBB” como são
agora chamados os grupos que aglutinam parlamentares da “bala”, da “bíblia” e
do “boi” e, mais como um revide ao Executivo, pelos já conhecidos
desentendimentos e conveniências, conseguem cooptar número suficiente para
aprovar a proposição.
Longe de querer
discutir qualquer cunho de constitucionalidade, ou não, da matéria sobre o que
existem algumas discordâncias entre os doutos da área. Não temos nenhum tipo de
competência para discutir o assunto. Nosso questionamento é puramente sob o
enfoque social com suas prováveis desastradas conseqüências. Todos estão cientes
da questão da marginalidade na qual foram incluídas por nós milhares (ou
milhões?) de crianças. Há muito isso está a exigir uma providência institucional
séria e imediata – que nunca surge -, mas, certamente, nenhuma delas passa por
aumentar o número daqueles que são diariamente formados ou aperfeiçoados em
nossas “universidades” do crime, que são as masmorras medievais que pululam
pelo País. Alguém tem dúvida de que – com as condições dos presídios que temos
- as penas impostas aos que cometeram crimes só contribuem para torná-los
piores do que antes de praticarem os delitos?
Na questão prática,
cabe perguntar: onde pretendem colocar esses jovens se já não há lugar para
adultos, considerando que há milhares de mandatos que não podem ser cumpridos por
falta de espaço nas cadeias já superlotadas?
Estamos querendo
diminuir as conseqüências do avanço da criminalidade, através de medidas
paliativas que servirão, apenas, para dar uma resposta à opinião pública
formada por uma mídia falsa e inconseqüente que atribui a culpa apenas aos
jovens infratores?
O que se pode esperar
com a diminuição da maioridade penal para 16 anos é que os malfeitores passarão
a recrutar, para seu serviço, os menores que ainda não atingiram essa idade.
Parece-me uma obviedade. E se isso ocorrer, teremos que ir, gradativamente,
diminuindo a idade penal até chegarmos a ter que instituir “jardins de infância
correcionais”. Pelo jeito, isso seria um êxtase para alguns que, apenas,
conseguem enxergar as conseqüências sem assumirem a responsabilidade pelas
causas, que são de todos os que compõem uma sociedade que admite que ocorram as
desigualdades que, em sua maioria, conduzem a situação que jogam as crianças
nos caminhos anti-sociais que conhecemos.
Para quem cultua
números, lembro alguns em relação ao tema em debate. Temos, hoje, no Brasil 26
milhões de adolescentes. Desses, apenas 0,08% estão privados da liberdade por
delitos cometidos. Entre esses, 63% foram detidos por roubo ou por associação
com
tráfico de drogas. Por tentativa de homicídio e outros
crimes o número cai para 0,0l% do total dos adolescentes do País. Será que essa
incidência é fator suficiente para produzir uma medida que vai gerar efeitos
definitivos sobre um número tão grande de jovens?
Cabem, ainda, outros
questionamentos: essa mudança implicará a possibilidade de que as crianças de
apenas 16 anos possam, também, obter carteira de motorista e, pior, poderão,
livremente, consumir bebida alcoólica? Ou serão maiores apenas para serem
jogados em celas imundas para aprenderem a desempenhar uma atividade criminosa
com maior perfeição?
E o Estatuto da
Criança e do Adolescente, cantado em prosa e verso, já não prevê penas
suficientes adaptadas à faixa etária de cada infrator, com suas conseqüências
devidamente previstas na forma legal? A resposta deixo para os doutos na
matéria.
Voltando ao título,
resumo o que penso (desculpem a radicalidade): precisamos urgentemente é de um
projeto que institua uma “maioridade mental” para aqueles adultos que continuam
querendo acabar com as más conseqüências ignorando – por conveniência e vontade
própria - as causas que as originam.
Porto Alegre, abril/2015
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