quarta-feira, 15 de agosto de 2018

O NÁUFRAGO



 Fora o clássico modelo de náufrago. O barco em que navegava naufragou e ele foi o único a escapar com vida. Os demais companheiros haviam perecido. Como andavam  velejando em lugar próximo a uma ilha deserta  ele conseguiu chegar lá, mas com bastante esforço.

 Ali ficou vivendo durante algum tempo, alimentando-se de frutas que conseguia apanhar próximo da praia. O clima era ameno e ele conseguia dormir coberto de algum tipo de vegetação que se encontrava no ambiente. Embora bastante magro pela frugalidade da alimentação ele conseguia sobreviver razoavelmente.

 Não se animava a explorar o interior da ilha e havia dias em que sentia que estava sendo observado, mas nunca conseguiu tirar sua dúvida.

 Uma manhã, quando acordou com o sol já alto encontrou uma enorme cesta rústica repleta de verdadeiras iguarias para as condições da ilha. Eram vários espécies de frutas que não havia ainda comido e, até, alguns pedaços de peixe cozido em um saboroso tipo de molho. Comeu até fartar-se, embora estivesse desconfiado da generosidade inusitada. E assim passou acontecer durante muito tempo.

 Muitas vezes esteve a pensar que era, talvez, considerado um deus pelos nativos do lugar, mas não entendia porque não vinham prostrar-se ante seu novo senhor. Pensar nisso o deixava satisfeito, contando que um dia poderia determinar a que fizessem para ele uma grande jangada e ele pudesse sair dali.

 Um dia, ele dispôs-se a descobrir quem trazia aqueles presentes todos os dias. Permaneceu acordado toda a noite, fazendo que dormia até que conseguiu ver que um nativo – isso ele deduziu – trazia a bandeja com os alimentos. Era uma pessoa alta, bem forte com cabelos compridos, imberbe com a pele escurecida pelo sol tropical e com um semblante que resplandecia satisfação. Depois que os dois superaram a surpresa, ele tentou fazer-se entender por sinais porque, embora o nativo emitisse alguns sons, ele não teve a menor possibilidade de entender o que queriam dizer.

 Passou algum tempo – talvez semanas - e, então, os dois começaram a entender-se melhor. Pouco a pouco um conseguia transmitir alguma coisa ao outro.

 Um dia, ele julgou que já tinha conhecimento suficiente para fazer a pergunta que trazia trancada na garganta e ele a fez ao amigo com quem, agora, já conversava razoavelmente todos os dias na língua local.

 “Por que eles me tratam assim, me trazendo tanta coisa boa e nunca se aproximaram de mim para um contato?”

 A resposta veio depois de uma pequena hesitação naquela estranha linguagem, mas bastante clara para que o náufrago entendesse: “Eles estão engordando você!”







7 comentários:

  1. Valeu!
    Em pele e osso, quem dá churrasco?

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  2. De boas intenções têm que se desconfiar sempre,
    até do relógio que trabalha de graça,
    que dirá de humano desconhecido,
    a quem mal o entende?

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  3. Se ele teve cérebro para entender, haveria cérebro para agir... O negócio era ganhar tempo para arquitetar algo.
    Quantos de nós somos alimentados assim?!... Ah história ou estória abre caminho para muitas reflexões... Muito bom texto tio lalau...

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