sexta-feira, 20 de abril de 2012

500 ANOS: NÓS ACREDITAMOS NELES

 Nós acreditamos neles quando disseram que haviam chegado por acaso. Acreditamos neles quando invadiram este país e disseram que o haviam "descoberto". E quando afirmaram que só o Deus deles era verdadeiro e estava do lado deles. Acreditamos neles quando disseram que os negros e índios não tinham alma e eram raças inferiores e que deveriam ser seus escravos. Acreditamos neles quando nos trouxeram um rei que fora mandado pelo deus deles para nos governar e a ele deveríamos ser submissos. Acreditamos neles quando executaram muitos porque mentiam quando queriam "liberdade". Depois, acreditamos neles quando um outro rei nos "independizou" e fez-nos crer que, a partir de então, éramos um país livre. Acreditamos neles quando nos fizeram massacrar países vizinhos porque eram nossos inimigos. Depois, acreditamos neles quando nos disseram que mudaram o regime para república porque teríamos progresso e livre pensamento. Mais tarde, acreditamos neles quando fizeram revoluções em benefício do povo e censuraram, perseguiram, baniram, aprisionaram, torturaram e mataram e nos disseram que era para o nosso bem; era em defesa da nossa propriedade, da nossa família e das nossas tradições cristãs.

 Muitas vezes nos disseram que precisávamos elegê-los para os parlamentos a fim de que pudéssemos ter vida melhor e poder defenderem-nos da inflação e do desemprego - e nós acreditamos neles. Disseram, também, que precisávamos trabalhar e que havia miséria porque éramos acomodados e tínhamos muitos filhos; que o bolo precisaria crescer para depois reparti-lo entre todos. Nós acreditamos neles quando implantaram planos econômicos e criaram novas moedas, dizendo que eram fortes.

 E assim se passaram 500 anos e nós continuamos acreditando neles, que eram os mesmos que haviam chegado aqui por acaso e apenas foram se adaptando. Apenas transformaram caravelas em porta-aviões; reis em generais ou presidentes; conselheiros em ministros. Nossos inimigos também se modernizaram: em vez de dos hereges e libertários de então, foram os comunistas que comiam crianças e a inflação que destrói a economia. Eles também mudaram de roupa, de estilo e de linguagem, mas são os mesmos joãos, antônios e henriques que, ontem, como agora, querem que continuemos acreditando neles e em suas mentiras maravilhosas que nos contam como se fôssemos crianças que ouvem historinhas de fantasia. E ainda vamos continuar acreditando como se fosse a verdade que esperamos. Esta verdade que, um dia, ainda vamos encontrar quando os poucos que hoje não acreditam mais neles serão tantos que eles não terão mais a quem mentir.

(Wenceslau Gonçalves/20.04.00)

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