quarta-feira, 2 de julho de 2014

GUERRILHA URBANA

 A batalha estava por iniciar. A ordem era limpar o terreno a qualquer custo. Primeiro chegaram os sapadores para observar a área. Repararam em tudo com olho clínico de quem tem longa experiência no assunto. Não eram muitos. Dois ou três que quase se confundiam com a sombra que projetavam alguns edifícios próximos. Vagaram por alguns minutos entre o pouco que restava a ser destruído e se foram. A conclusão era a de que não necessitariam de um efetivo militar muito grande. Por certo, já confabulavam entre si, arquitetando um infalível plano de ataque.

 No dia seguinte, chegaram os monstros de aço aos quais não se poderia oferecer resistência. Eram dois. Um era enorme e possuía duas grandes mandíbulas. Uma, com tridentada e ameaçadora garra comprida e de longo alcance e, outra, menor, que apenas lhe servia de cobertura. O outro monstro é apenas conivente. Comparando, ele é, apenas, um monstrinho. Chega ao local e se imobiliza. É dos que somente aguarda que o primeiro lhe entregue o produto da destruição e parte rápido para voltar logo depois. Ambos são barulhentos - produtos do mundo moderno - e enegrecidos pelo próprio fumo que expelem. E, assim, começa a batalha. O inimigo é cercado por todos os lados. Sua única defesa é o conhecimento do terreno. Nasceu e viveu há muito tempo ali. Ninguém, como ele, sabe de suas nuances e possibilidades. É, inutilmente, ajudado pela umidade e pelos sais minerais que seguram suas raízes entranhadas na terra. A sua cor verde já tem bastante do resquício da civilização que o circunda. Já pariu muitos frutos e acolheu muitos pássaros com seus membros fortes. No inverno, abrigou-os do frio; no verão, apaziguou-lhes o calor. Cumpria sua missão com galhardia. A resistência, no entanto, é inglória porque sua desvantagem é gritante: contra ele há todo o progresso de vinte séculos de civilização que não reconhece nenhum direito adquirido para resistir os obstáculos em sua caminhada.

 A batalha continua. Pouco a pouco, o terreno cede à ação dos monstros e deixa o inimigo só, sem seus aliados. Agora é sua vez de sucumbir. Estremece. Tremulam seus galhos e folhas. Cai o último ninho que ainda resistia e ela própria aspira seu último quinhão de oxigênio e cai prostrada na terra que, há pouco, ainda lhe transmitia a seiva vital para sua existência. É, apenas, mais uma árvore que tomba em uma grande metrópole. Não vai nem participar das estatísticas!

(Wenceslau Gonçalves/ Publicado no jornal Fronteira Meridional, de Jaguarão em 21.05.14)

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