sexta-feira, 23 de setembro de 2011

CARTA PARA UM SOBRINHO

 João Thomaz:

 (Como se dizia antigamente): "Começo estas mal traçadas linhas" depois que deixei passar alguns dias da tua formatura, que ocorreu em Bagé, quando recebestes teu canudo de médico-veterinário. Fiz isso, para não me deixar enredar muito pelo entusiasmo sentimental de ver um guri, que há pouco ainda andava pelo colo da gente - "salamero" por demasia - encantando com a simpatia os parentes e amigos dos meus compadres.

 Hoje, que já estás taludo, graças a nossa convivência, sabes um pouco do que penso e eu sei um pouco de como pensas. Não estou te dando um conselho; é apenas uma reflexão conjunta entre um jovem - que eu reconheço como cheio de ideias e ideais - e um madurão com algumas horas de passagem pelo mundo.

 A profissão que escolhestes, em uma terra em que bilhões sofrem de fome constante, representa, cada vez mais, uma responsabilidade de contribuir para varrer essa chaga que deveria envergonhar os que convivem com ela. É verdade que não basta apenas produzir alimento suficiente para todos;  é preciso que, acima do interesse econômico, exista vontade política de solucionar o problema e, tudo indica, ela surge episodicamente mas não consegue prosperar. Se vivemos em um País e, particularmente, em um Estado, onde a pecuária é tão importante, é justo que um maior número de pessoas desfrute de seus benefícios e sabemos que isso não acontece.  Penso que terá sido em vão todos os esforços para que uma ciência avance se isso não visar à melhoria da vida das pessoas, independente de sua situação financeira. Desenvolvimento que não é para todos é, apenas, mais uma forma de acúmulo de riqueza.  Tens uma tarefa árdua pela frente se quiseres dar tua contribuição para uma mudança.

 João Thomaz, ocorrerão momentos em tua carreira que terás dúvidas. Não falo das técnicas, porque para essas poderás recorrer aos melhores compêndios; falo daquelas em que terás que consultar a tua formação, a tua ética profissional e a tua consciência. Como em qualquer setor da atividade humana, na ciência também não há neutralidade. Tomar posição é privilégio e ônus dos seres pensantes. Os mais preparados para tomarem as decisões certas serão aqueles que melhor tiverem desenvolvido seu sentimento de coletividade.

 Fico por aqui. Sou parceiro numa torcida em que, por certo, há muitos componentes, que pensam das mais variadas formas mas, todos eles, com certeza, apostam em que sempre hás de optar pelo que for melhor para os que confiarem na tua aptidão e na tua capacidade de trabalho.

 Um grande abraço, do tio Wenceslau.

Um comentário:

  1. Querido escritor,
    Pensei que havia deixado resgistrado meu comentário no dia que li esta nota, mas agora vejo que não foi assim...
    Na condição de irmã mais velha do formando agradeço por tão generosas linhas!!!
    Fico feliz e emocionada com tudo o que li nesta belíssima homenagem!
    Beijos e mais beijos!
    Marcele e Flia.

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